Você já se perguntou por que está tão difícil dizer “não” para uma criança? Muitos pais têm evitado colocar limites por culpa ou medo de não serem amados. O problema é que, ao abrir mão desse papel, transferem para a escola uma função que deveria começar em casa. A consequência é uma geração com dificuldade em lidar com frustrações.
Em uma rotina marcada por excesso de trabalho, pouco tempo em família e muita pressão, muitos pais acabam sendo permissivos. Sentem-se culpados por não estarem presentes o suficiente e, para compensar, evitam conflitos, cedem aos pedidos dos filhos e deixam de impor limites. No entanto, especialistas alertam: o limite é parte essencial do desenvolvimento emocional da criança.

A rotina corrida e o sentimento de culpa muitas vezes dificultam o exercício da autoridade pelos pais (foto: Adobe Stock)
Segundo a psicóloga Rosely Sayão, referência nacional em educação, “pais não são amigos dos filhos. São pais. E isso implica educar, orientar e, sim, colocar limites”. No livro Educar sem culpa: a difícil tarefa de ser pai e mãe, Sayão argumenta que a responsabilidade de formar emocionalmente uma criança não pode ser delegada à escola. Ainda assim, observa-se hoje um movimento crescente de famílias que esperam que essa função seja assumida por professores e coordenadores.
Esses profissionais enfrentam dificuldades em manter a disciplina quando percebem que a criança não reconhece a autoridade do adulto ou chega à escola sem saber lidar com regras. “É muito difícil estabelecer limites na sala de aula quando, em casa, tudo é permitido”, explica Mariana Castro, coordenadora pedagógica de uma escola particular em São Paulo.

A ausência de limites em casa impacta a convivência e a aprendizagem na escola (Foto: Canva)
A ausência de limites compromete o processo de aprendizagem, aumenta os conflitos entre alunos e torna a convivência escolar mais desafiadora. A criança que não aprende a lidar com frustrações em casa tende a apresentar dificuldades sociais e emocionais nos demais ambientes.
Essa inversão de papéis, pais que evitam educar e escolas que precisam assumir esse espaço, gera impactos significativos. As instituições de ensino, já sobrecarregadas com conteúdos e metas pedagógicas, precisam dedicar tempo para gerenciar comportamentos que deveriam ter sido orientados em casa. Isso afeta não apenas o desempenho individual, mas todo o ambiente escolar.
A autoridade saudável, aquela que orienta, acolhe e estabelece limites com respeito, é muito diferente do autoritarismo. Enquanto o autoritarismo impõe obediência pelo medo, a autoridade verdadeira promove confiança e segurança. Crianças que crescem com limites claros tendem a se tornar adultos mais responsáveis, empáticos e resilientes.
É compreensível que muitos pais sintam dificuldades. Nem todos foram preparados emocionalmente para exercer a parentalidade em um mundo tão exigente. Além disso, a pressão para “dar conta de tudo” é real. No entanto, essa sobrecarga não justifica a omissão. O vínculo entre pais e filhos se fortalece justamente quando há presença, escuta e orientação.
Educar com limites não é um ato de dureza, mas de cuidado. Estabelecer regras claras, com amor e coerência, é um dos maiores presentes que os pais podem oferecer aos filhos. Quando a criança entende que existe um adulto que a orienta, que a escuta, mas também sabe dizer “não”, ela se sente segura para crescer.

Colocar limites com afeto fortalece o vínculo entre pais e filhos e promove segurança emocional (Foto: Canva)
O medo de não ser amado, a culpa por não estar presente o tempo todo ou o desejo de evitar conflitos não podem ser maiores do que a responsabilidade de formar um ser humano. A escola tem um papel essencial no processo educativo, mas não substitui o lar como base da formação emocional e moral.
Ao contrário do que muitos pensam, crianças não amam menos os pais que colocam limites. Elas os respeitam, os admiram e aprendem com eles. Ser pai e mãe exige constância, firmeza e afeto. E não existe autoridade mais verdadeira do que aquela exercida com presença, empatia e responsabilidade.
O mundo precisa de adultos equilibrados e esse equilíbrio começa com uma infância que reconhece que nem tudo é permitido. E que, mesmo diante das frustrações, existe amor.