Confesso que quando me convidaram para escrever sobre o Dia dos Pais, eu congelei. Não sou pai (a não ser dos meus pets, que já me ensinam muito), e minha relação com o meu próprio pai… bom, foi tudo, menos simples.
Durante muito tempo, falar sobre ele era sinônimo de incômodo. Um buraco silencioso se formava no estômago só de ouvir a palavra “pai”. Não por falta de presença, mas por falta de presença afetiva. Estávamos lá, mas não estávamos juntos. Faltaram conversas, abraços, escuta. Faltou aquele tipo de amor que se diz em silêncio — mas que também se expressa com gestos, com olhos que se entendem, com alguma delicadeza.

Entre o que foi e o que faltou: memórias que ganham novos significados com o tempo (Foto: Envato)
Por muito tempo carreguei esse peso. E, sim, havia um rancor. Mas, com o tempo (e com muita terapia, processos internos e silêncio), percebi que aquele rancor era só uma forma meio torta de amor. Amor que não foi correspondido do jeito que eu precisava. Amor que talvez ele também não soubesse como dar.
Foi só depois da morte dele que eu comecei, de verdade, a entender quem era meu pai — e quem eu fui ao lado dele. A distância, curiosamente, foi o que me aproximou. A ausência virou espelho. E nesse reflexo, passei a enxergar não só as faltas dele, mas as dores que ele também carregava. Foi ali que a saudade começou a virar cura.
Uma das experiências mais marcantes dessa jornada foi a Constelação Familiar. Ali, pela primeira vez, olhei para ele com outros olhos. Sem o peso da mágoa, sem a expectativa do filho carente. Vi o homem antes do pai. Vi a história antes da dor. E isso mudou tudo.
Não, a relação não se consertou em vida. Mas dentro de mim, alguma coisa se reorganizou. Hoje, no Dia dos Pais, não sinto mais o incômodo de antes. Sinto saudade, sim. Mas também gratidão — por tudo que foi, e até pelo que não foi. Porque foi nesse vazio que encontrei um caminho de reconciliação comigo mesmo.

A ausência pode ser o começo de uma reconciliação interior (Foto: Envato)
E é sobre isso que eu queria escrever hoje. Nem todo mundo vive relações dignas de propaganda de margarina. Às vezes, o amor existe, mas vem atravessado de silêncios, de histórias mal contadas, de repetições familiares que a gente mal compreende. E tudo bem.
Se você também sente algo assim nesse dia — um nó, uma saudade do que nunca foi, um aperto que não sabe explicar — saiba que você não está sozinho. A gente aprende, aos poucos, a honrar nossos pais do nosso jeito. Mesmo que seja só em pensamento. Mesmo que seja só depois.