Sustentado em três pilares — fé, arte e festa —, o São João do Maranhão se destaca entre as festividades juninas do país por sua riqueza de ritmos, estilos e expressões culturais. A exuberância das cores, das musicalidades e das indumentárias levou, em 2019, ao reconhecimento do Complexo Cultural do Bumba Meu Boi do Maranhão como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela Unesco. É essa celebração cheia de magia que visitantes encontram no estado durante o Maior São João do Mundo.
Presente em São Luís e em diversas regiões maranhenses, o Bumba Meu Boi é a manifestação mais emblemática da cultura popular do estado. O termo “complexo cultural” evidencia a amplitude da celebração, que reúne teatro, dança, música, religiosidade, artesanato e oralidade. Em 2011, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) reconheceu o bem como Patrimônio Cultural do Brasil, passo que antecedeu sua inclusão na lista da Unesco.

Brincantes, personagens e turistas tomam as ruas de São Luís em uma festa que mistura tradição, alegria e inclusão (Foto: Divulgação Governo do Maranhão)
A manifestação é profundamente marcada pelas influências indígenas, africanas e europeias, e se organiza a partir de uma narrativa dramatúrgica que recria, com humor e devoção, aspectos da vida rural, o ciclo do gado e a reverência aos santos juninos.
Em 2024, para aprofundar o conhecimento sobre essas tradições, o Governo do Maranhão, por meio do Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e Cartográficos (Imesc), lançou o estudo “São João do Maranhão: tradições das festas juninas”. A publicação aborda aspectos religiosos, culturais e econômicos do período, um dos mais importantes do calendário estadual.

Companhias folclóricas misturam ritmos e estéticas diversas para celebrar o orgulho maranhense no Maior São João do Mundo (Foto: Divulgação Governo do Maranhão)
Ritmos, sotaques e personagens do Boi
O Bumba Meu Boi hoje está presente nos 217 municípios maranhenses e se manifesta por meio de cinco principais sotaques — ou estilos —: matraca, orquestra, baixada, zabumba e costa-de-mão. Cada um deles carrega formas distintas de musicalidade, figurino e expressão cênica.

A musicalidade do Bumba Meu Boi pulsa nos sotaques e nos tambores que ecoam pelos arraiais do Maranhão (Foto: Divulgação Governo do Maranhão)
O sotaque de matraca, também chamado sotaque da Ilha, tem origem em São Luís. O instrumento principal — dois pedaços de madeira batidos entre si — dá nome à forma musical e acompanha toadas marcantes. Grupos como os bois de Maracanã e Maioba, com mais de um século de história, protagonizam clássicas rivalidades e compõem as trilhas sonoras do São João com músicas que exaltam lendas, belezas naturais e os próprios feitos dos grupos.
O sotaque da baixada, ou de Pindaré, é tradicional no norte do estado e reúne bois como o de Santa Fé, o de Pindaré e o União da Baixada. Com instrumentos como matracas, pandeiros e maracás, a brincadeira incorpora o personagem Cazumbá — figura mística e andrógina, com traje animalesco, que representa o elo entre diversão e ancestralidade.
O sotaque costa-de-mão, originário de Cururupu, destaca-se pelo modo como os pandeiros são tocados com o dorso das mãos, muitas vezes até causando ferimentos. Os trajes, bordados com esmero, incluem chapéus cônicos com longas fitas coloridas. Os grupos Rama Santa e Brilho da Areia Branca são alguns dos representantes mais conhecidos.
Mais recente, o sotaque de orquestra surgiu nas décadas de 1950 e 1960, em Rosário e Axixá, com forte presença de instrumentos de sopro e banjo. É o estilo que mais cresceu nos últimos anos, com grupos como o Boi de Axixá, o Boi de Morros e o Boi Brilho da Ilha.
Já o sotaque de zabumba, o mais antigo entre todos, nasceu no município de Guimarães. A zabumba, tocada com o instrumento apoiado em varas de madeira, se une ao tambor-onça, apitos e pandeirinhos para formar um ritmo acelerado, por vezes comparado ao samba. É um dos estilos que mais preservam influências africanas e açorianas.
Um auto popular que move comunidades
O Bumba Meu Boi se estrutura como um auto popular — uma encenação dramática de origem rural e religiosa. A história gira em torno do boi que adoece e morre após ser desejado por Mãe Catirina e abatido por Pai Francisco. Com a ajuda de pajés, o animal renasce, numa narrativa que celebra o ciclo da vida e o poder da fé.
O ciclo festivo é composto por quatro fases: os ensaios comunitários, o batismo do boi, as apresentações nos arraiais e, por fim, a morte do boi, que encerra a temporada. A expressão “bumba meu boi” carrega o sentido de movimento e convocação: avante, meu boi!

Indumentárias ricamente bordadas, dança e teatralidade compõem o auto do boi, encenado com devoção e espetáculo (Foto: Divulgação Governo do Maranhão)
Mais do que boi: o São João do Maranhão em toda sua pluralidade
Embora o boi seja protagonista, o São João do Maranhão contempla uma ampla variedade de manifestações culturais. Nos arraiais, convivem danças como a quadrilha, o tambor de crioula, o cacuriá, a dança portuguesa, o coco, o lelê, o caroço e a dança do boiadeiro.
Grupos folclóricos misturam ritmos, canto e coreografias em espetáculos que celebram a diversidade do povo maranhense. Toda essa riqueza cultural pode ser vivenciada por moradores e turistas em espaços como o Ceprama, o IPEM e o Parque Folclórico da Vila Palmeira, em São Luís, além de polos regionais como Barreirinhas.
Também fazem parte do circuito as celebrações nos largos das igrejas de Santo Antônio e São João, o encontro de bois na Capela de São Pedro e a Festa de São Marçal, que encerra oficialmente a temporada junina.
Em 2024, o São João contou com mais de 700 atrações entre junho e julho, distribuídas em 12 arraiais oficiais da capital e em festas nos principais municípios do estado. Em 2025, a expectativa é de que o Maranhão continue a encantar o Brasil — e o mundo — com a força da sua cultura popular.