Cultura

Dom João I: o fundador da Dinastia de Avis e o consolidar de Portugal

Por
Tânia Rabêllo

9/9/2025

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Encontro de D. João I de Portugal com João de Gante na Ponte de Mouro (século XV). Miniatura atribuída a Jean Wavrin, presente na obra “Chronique de France et d’Angleterre” (Foto: WikiCommons)

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Monarca assegurou a independência do reino na crise de 1383-1385, estabeleceu a Dinastia de Avis e lançou as bases para a expansão marítima portuguesa

D. João I (1357-1433) é uma figura central na história de Portugal, responsável por garantir a independência do reino em um dos momentos mais críticos de sua existência. Filho ilegítimo de D. Pedro I, ele ascendeu ao trono após a crise de 1383-1385, um período turbulento que ameaçou a soberania do país. Sua vitória na Batalha de Aljubarrota e a subsequente fundação da Dinastia de Avis consolidaram seu legado como um dos monarcas mais importantes de Portugal, cujos feitos marcaram o início da expansão marítima e a ascensão da nação como uma potência europeia.

A crise de 1383-1385: o contexto do conflito

Após a morte de D. Fernando I, último rei da Dinastia de Borgonha, em 1383, Portugal entrou em uma crise de sucessão. O rei não deixou herdeiros homens, e sua filha, D. Beatriz, estava casada com o rei de Castela, João I. Este casamento criou um dilema: se Beatriz herdasse o trono, Portugal corria o risco de ser anexado por Castela, algo que muitos nobres e a população temiam. Em resposta, surgiu um movimento de resistência, e D. João, mestre da Ordem de Avis e filho ilegítimo de D. Pedro I, foi proclamado defensor do reino.

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Dom João I de Portugal (início do século XV), fundador da Dinastia de Avis (Foto: WikiCommons)

A batalha de Aljubarrota: o momento decisivo

A crise escalou para uma guerra com Castela, culminando na Batalha de Aljubarrota, em 14 de agosto de 1385. D. João, com o apoio de Nuno Álvares Pereira, conseguiu uma vitória decisiva contra o exército castelhano, que era numericamente superior. Esta batalha garantiu a independência de Portugal e estabeleceu D. João I como rei legítimo. A vitória também reforçou o nacionalismo português, visto que a própria população se envolveu na luta pela manutenção de sua autonomia.

A fundação da Dinastia de Avis

Com a vitória em Aljubarrota, D. João I foi oficialmente coroado rei de Portugal, iniciando a Dinastia de Avis, que governaria o país por mais de dois séculos. Seu reinado, marcado por uma política interna de fortalecimento da monarquia, trouxe estabilidade após um período de incertezas. Ele estabeleceu alianças importantes, como o Tratado de Windsor, em 1386, que selou uma aliança com a Inglaterra, uma das mais antigas parcerias diplomáticas da história.

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Ilustração medieval da Batalha de Aljubarrota (1385), vitória decisiva pela independência de Portugal (Foto: WikiCommons)

Casamento com Filipa de Lencastre

Um dos eventos mais marcantes do reinado de D. João I foi seu casamento com Filipa de Lencastre, em 1387, filha de João de Gante, duque de Lencastre. Este matrimônio fortaleceu ainda mais a aliança com a Inglaterra e deu origem à chamada Ínclita Geração, grupo de filhos que deixou uma marca profunda na história de Portugal. Entre eles estavam o Infante Dom Henrique, conhecido como o Navegador, e Dom Duarte, que sucederia o pai no trono.

O impulso à expansão marítima

Durante o reinado de D. João I, Portugal começou a lançar as bases para sua expansão ultramarina. Embora as grandes descobertas ocorram sob seus sucessores, foi sob seu governo que começaram as primeiras expedições ao Atlântico. Em 1415, ele organizou a conquista de Ceuta, na costa norte da África, marco simbólico que inaugurou a era de expansão colonial portuguesa.

O caráter religioso e político de seu governo

Dom João I era profundamente religioso, e sua fé influenciou diversas decisões de seu governo. Sua aliança com Nuno Álvares Pereira, fervoroso religioso depois canonizado, reforçou sua legitimidade. Ao mesmo tempo, usou a fé para unir nobres e povo em torno da ideia de uma monarquia divina e nacionalista.

O equilíbrio interno: centralização do poder

Para consolidar seu poder, Dom João I precisou equilibrar os interesses da nobreza e da burguesia emergente. Ele promoveu a centralização do poder, limitando a influência de famílias nobres e favorecendo a burguesia das cidades portuárias, fortalecida pela economia marítima.

Controvérsias e suspeitas de usurpação

Como filho ilegítimo, sua legitimidade foi questionada durante a crise de sucessão. A execução de João Fernandes Andeiro, amante da rainha Leonor Teles, foi um dos episódios marcantes do início da revolta popular que o levou ao trono.

O Tratado de Windsor: a grande aliança com a Inglaterra

Assinado em 1386, o tratado formalizou a aliança com a Inglaterra e consolidou laços militares, culturais e econômicos duradouros. Esta relação diplomática é considerada uma das mais antigas e estáveis da história europeia.

A conquista de Ceuta

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Representação da conquista de Ceuta (1415), símbolo do início da expansão ultramarina portuguesa (Foto: WikiCommons)

A tomada de Ceuta, em 1415, marcou o início da expansão portuguesa além-mar e garantiu o controle de rotas comerciais estratégicas.

A Ínclita Geração

Os filhos de D. João I, conhecidos como Ínclita Geração, moldaram o futuro do reino. Destacam-se o Infante Dom Henrique, que impulsionou a expansão marítima, e Dom Duarte, que sucedeu o pai no trono.

Cultura e educação no reinado

Influenciada por Filipa de Lencastre, a corte de D. João I tornou-se centro intelectual e cultural. Foram incentivadas traduções de textos clássicos, o desenvolvimento da língua portuguesa e a educação dos príncipes.

O legado duradouro

Ao falecer em 1433, D. João I deixou Portugal independente, estável e preparado para a era dos descobrimentos. Sua habilidade política, vitórias militares e visão estratégica o consagraram como um dos maiores reis da história portuguesa.


Fontes consultadas

  • José Mattoso (coord.). História de Portugal, vol. 2
  • João Gouveia Monteiro. A Batalha de Aljubarrota
  • Manuela Mendonça. João I de Portugal: Crise, Revolução e Ascensão
  • Fernão Lopes. Crónica de D. João I
  • A.H. de Oliveira Marques. “O Tratado de Windsor: Aliança Luso-Britânica”
  • Enciclopédia Britannica; Oxford Reference; Museu da Batalha de Aljubarrota; Biblioteca Nacional de Portugal