Sou da época do bate-papo UOL. Sim, estou velha. Naquele tempo, eu adorava interagir com pessoas fora do meu círculo de relacionamentos. Foi assim que conheci o G.: coach, empresário e um viajante inveterado. Cada vez que conversávamos, ele estava em um lugar diferente — Nova York, São Paulo, entre outros. Até que um dia ele lançou a proposta:
— Vamos nos conhecer?
Já conversávamos há bastante tempo, então pensei: por que não? Nosso primeiro encontro foi para tomar um café, trocar o teclado pelo tête-à-tête. Ele fugiu um pouco das minhas expectativas físicas — na época, eu preferia os gordinhos — mas, no geral, foi um encontro agradável.

Nos tempos dos bate-papos online, o anonimato era um passaporte para a descoberta — e para experiências improváveis (Foto: Shutterstock)
Marcamos outro dia para jantar no hotel onde ele estava hospedado. E, claro, depois do jantar, ele perguntou se eu queria subir. Por que não também?
Após aqueles beijos clássicos à beira da cama, G. começou a tirar minhas sapatilhas rosa com glitter, incrivelmente tenebrosas. Ele notou meu desconforto com a posição e desceu ao chão. Tirou minha outra sapatilha e, enquanto eu ainda tentava entender a situação, ele começou a massagear meus pés. Até que chegou ao ápice: lambeu cada centímetro dos meus pés, como se estivesse comendo uma manga de fiapo madura. Eu não sabia se queria rir ou cavar um buraco e me enterrar ali mesmo.
Enquanto ele se deliciava com meu pé, eu só conseguia pensar: “E se alguém entrar agora e ver isso?” e “Meu Deus, que chulé essas sapatilhas de plástico devem estar!”
Acham que isso o impediu? Nenhum pouco. Para ele, aquilo foi a realização do maior fetiche que já teve: pés suados.
Logo após aquele primeiro encontro, eu o bloqueei. Sem explicações, sem conversa. Eu tinha 19 anos e uma mente limitada para tudo que fugisse do “normal”. Hoje, vejo as coisas de outra forma. Para mim, o ápice da intimidade é quando alguém confia o suficiente para expor seus desejos e fetiches mais secretos, aqueles que você leva várias sessões até conseguir falar para sua terapeuta.

O que antes era vergonha virou curiosidade. O desconforto de ontem pode ser o fetiche (ou o insight) de hoje (Foto: Adobe Stock)
Cresci em um lugar pequeno, onde todos se conhecem e onde o medo do que os outros vão pensar ou comentar nos poda muito, limitando nossas atitudes e ações. No velho mundo dos bate-papos online, aprendi que existe de tudo, e isso me permitiu experimentar o que eu queria, sem julgamentos.
Meu ex tinha uma seletividade alimentar curiosa: ele julgava o gosto pela aparência. Seu lema era: “Nunca comi, mas não gosto.” Eu, ao contrário, sempre busquei provar coisas novas, sair da minha zona de conforto. Num restaurante em Barcelona, enquanto eu examinava o cardápio, ele comentou algo que me fez rir e concordar:
— Existem dois tipos de pessoas: as “pessoas Ivone”, que provam qualquer comida só pelo prazer de dizer que experimentaram, mesmo que não gostem, e as “pessoas Eu”, que olham e já sabem que não vão gostar.
“Pessoa Ivone” me define, mas não se limita à gastronomia.
Inclusive, nessa mesma viagem, o fetiche da podolatria me perseguiu. Um “feticheiro” completamente aleatório me ofereceu uma quantia significativa por vídeos dos meus pés. Como ele me encontrou? Segundo ele, pelo check-in em uma foto. Fiquei tentada? Muito. Mas seria isso uma traição? Para mim, traição é a quebra de um acordo no relacionamento. A primeira pessoa a quem contei sobre a proposta foi meu parceiro na época, que prontamente não aceitou e eu respeitei. Mas, confesso, a tentação ficou. Lembrei-me da cena de Pulp Fiction em que Jules comenta com Vincent sobre o gângster Marsellus Wallace, que jogou um homem pela janela por ter feito uma massagem nos pés da esposa. Vincent questiona:
— Uma massagem? Só isso?
E é aí que percebemos que vai muito além do toque — envolve o nível de intimidade e desejo.

Nem sempre é fácil abrir o jogo, mas quando há escuta e confiança, até os fetiches mais improváveis ganham espaço para existir (Foto: Adobe Stock)
A verdade é que deixamos de falar ou fazer o que realmente queremos por medo do que o outro vai pensar. É por isso que muitos optam por relações superficiais, sem envolvimento emocional profundo. É mais fácil para um homem pedir uma massagem prostática a uma garota de programa do que à sua esposa, sem o risco de ser julgado. Adivinhem qual o maior público das garotas de programa: casados ou solteiros? (Pergunta dificílima, né?)
A chave é o autoconhecimento. Conhecer o próprio corpo, os limites, a intimidade — e até mesmo buscar ajuda terapêutica — pode ser valioso para expandir a mente e permitir-se. Permitir-se ser você mesma, explorar esse universo vasto de fetiches, excitação e sedução, que nos proporciona experiências únicas.

Experimentar algo novo — por escolha, por prazer ou por simples curiosidade — pode ser a forma mais honesta de autoconhecimento (Foto: Adobe Stock)
Samantha Jones brilhou ao dizer:
— Sou curiosa. Experimento tudo pelo menos uma vez.
E é assim que me permito ser uma “Pessoa Ivone”.
Quem sabe o que mais eu vou descobrir? Já aviso que conto pra vocês.