Comportamento

O maior incentivo é a admiração. O melhor presente é a presença

Por
Daniela Escobar

10/27/2025

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A admiração dos pais fortalece a autoestima e o desenvolvimento emocional das crianças (Foto: Envato)

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Quando os olhos de quem amamos refletem quem somos, ganhamos coragem para existir por inteiro. Porque o afeto que admira é também o que sustenta

Seja pelo medo de mudanças, por falta de vontade ou por duvidarem da própria capacidade, pais que não conseguem existir individualmente dificilmente permitem que seus filhos existam.

Por “existir”, quero dizer: ter coragem de seguir seus próprios sonhos pessoais e profissionais, em vez de se conformar com os que a família ou a comunidade elaborou para eles.

Esses pais apontam os caminhos que pensam que seus filhos deveriam seguir, mas não reconhecem ou validam qualquer outro trajeto que não tenha sido indicado por eles. E assim, não estimulam seus filhos a serem quem realmente são, nem a seguirem caminhos que fogem do convencional — aqueles que nascem do desejo genuíno de cada indivíduo. Caminhos cujas rotas não tenham sido conhecidas e trilhadas por outros, nem apresentem resultados previsíveis.

Ao não serem capazes de reconhecer, estimular ou admirar as conquistas e experiências individuais dos filhos, frequentemente também não os incentivam — o que faz com que muitos destes filhos desistam pelo caminho. De si mesmos, de seus sonhos, de seus projetos.

Outros passam a vida tentando angariar a admiração desses pais, mostrando o quanto foram além do que lhes foi ensinado, o quanto conseguiram conquistar por si mesmos. Esses filhos, por gastarem metade de suas energias em busca do reconhecimento pelo próprio valor, deixam de ir ainda mais longe. Conquistam menos do que a sua capacidade permitiria.

Acumulam frustrações, mágoas e derrotas financeiras, quando não conseguem seguir adiante sem o reconhecimento dos pais.

Outra consequência é a somatização. Somatizar é o processo de transferir o acúmulo de sentimentos tristes, emoções não expressas ou mal resolvidas para alguma parte do corpo, transformando-os em sintomas físicos. O resultado pode ser pior do que uma carreira infeliz ou incompleta — pode se tornar uma doença crônica ou autoimune.

Em qualquer idade, os filhos precisam da disponibilidade emocional dos pais em forma de admiração, para que lhes sirva de suporte.

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Memórias afetivas e presença parental, como paixões compartilhadas, criam vínculos profundos entre pais e filhos (Foto: Envato)

Até hoje, eu me pergunto se minha paixão por música e fotografia nasceu de observar o meu pai — que estava sempre com uma câmera nas mãos, registrando os momentos da nossa família na minha infância — ou se ela apenas encontrou eco nele.

Às vezes, encontrar esse eco é mais poderoso e transformador do que simplesmente receber direções. Porque, quando nossas paixões ecoam nos olhos de quem amamos, elas ganham força e sentido.

Esse eco é como um espelho silencioso. Ele não impõe, não cobra, não exige. Apenas reflete de volta o que há de mais verdadeiro em nós — e isso basta para nos sentirmos vistos.

Quando um filho se sente enxergado, reconhecido em sua essência, ela se fortalece por dentro. Ganha estrutura emocional para seguir seu próprio caminho, mesmo que ele seja incerto ou diferente do esperado.

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O reconhecimento dos pais impacta na saúde mental e emocional dos filhos em todas as fases da vida (Foto: Envato)

Esse tipo de reconhecimento é o que nutre nossa autoestima. É o que permite ao filho não apenas tentar ou persistir, mas não ter vergonha de errar, de criar com coragem.

Não se trata de os pais “concordarem” com cada escolha, mas de demonstrarem que estão dispostos a ver quem o filho é, sem desejar que ele seja outro. Esse olhar que acolhe, mesmo quando não entende completamente, é um dos pilares mais potentes da saúde emocional.

Mesmo adultos, ainda buscamos o reflexo do nosso valor nos olhos de quem foi (ou deveria ter sido) nosso primeiro espelho. Quando esse reflexo nunca existiu, passamos a vida tentando criá-lo: em chefes, em parceiros, em amigos, em prêmios — mas ele nunca tem o mesmo efeito.

Por isso, quando um pai ou uma mãe consegue se tirar da frente e permitir que o filho exista, essa simples atitude já constrói um alicerce seguro. Um lar interno do qual ele não precisará fugir — e sim, para o qual sempre poderá voltar.

O maior presente é a presença.
O maior incentivo é a admiração.