Com a chegada de dezembro, aumentam os encontros, o calor, os brindes e também uma rotina alimentar que costuma extrapolar limites. Entre bebidas alcoólicas, frituras, sobremesas e petiscos ultraprocessados, o corpo recebe um combo que afeta glicemia, colesterol, pressão arterial e inflamação. É o que explica o endocrinologista Fabiano Malard, professor do curso de Medicina do UniBH, ao lembrar que as celebrações são momentos importantes, mas também exigem atenção, especialmente para quem já convive com diabetes, pré-diabetes, obesidade, hipertensão ou colesterol alto.
Os dados mostram o tamanho do desafio: desde os anos 1980, a presença de alimentos ultraprocessados na dieta brasileira mais que dobrou, passando de 10% para 23%, segundo pesquisas lideradas por cientistas da USP. Esses produtos, cheios de calorias, açúcares de rápida absorção, gorduras saturadas ou trans e grandes quantidades de sódio, têm forte impacto no metabolismo. “Eles perdem fibras, vitaminas e minerais e ainda adicionam substâncias que favorecem inflamação e desregulação metabólica”, explica Malard.
A soma desses fatores provoca picos de glicemia, maior resistência à insulina, acúmulo de gordura visceral, aumento do colesterol LDL e elevação dos triglicérides. Já o sódio exagerado contribui para retenção de líquidos e elevação da pressão arterial. O endocrinologista reforça: não existe um nível totalmente seguro de ingestão de ultraprocessados. De forma prática, o recomendado é manter menos de 15% a 20% das calorias diárias vindas desse tipo de alimento.
Além da composição nutricional, os aditivos também exercem papel relevante. Emulsificantes podem alterar a barreira intestinal e a microbiota; corantes intensificam o estresse oxidativo; adoçantes afetam o paladar e podem estimular a busca por sabores ainda mais doces. “O problema não está em um componente isolado, mas no conjunto da obra”, observa.
O mito do “álcool social”

O álcool social e os petiscos do dia a dia festivo podem parecer inofensivos, mas impactam glicemia, colesterol e inflamação (Foto: Envato)
No fim do ano, outra armadilha frequente é o álcool. Mesmo o consumo moderado, a famosa taça “para relaxar”, não é totalmente inofensiva. As bebidas alcoólicas interferem no metabolismo do fígado, podendo alterar glicemia (com risco de hipoglicemia), aumentar triglicérides, favorecer acúmulo de gordura no fígado, causar inflamação e até risco de arritmias.
As diretrizes internacionais definem consumo moderado como até duas doses por dia para homens e uma para mulheres, mas Malard é direto: “O ideal é zero. Todo o resto é um ajuste para a vida real”.
Quando o álcool se mistura a frituras, embutidos e sobremesas, a chamada “sobrecarga metabólica” se instala. Entre os efeitos comuns estão distensão abdominal, gases, alterações intestinais, cansaço após refeições, mudança no sono, piora da pele, dificuldade de concentração, aumento da pressão e glicemia, além de ganho de peso. “O problema é que os sinais nem sempre são óbvios e assim o hábito se instala”, diz.
Como aproveitar as festas com saúde (e sem paranoia)

Planejar pequenas escolhas e não adotar o “tudo ou nada”, ajuda a atravessar a temporada de eventos sem prejuízo à saúde (Foto: Envato)
Em vez da lógica do “tudo ou nada”, o endocrinologista propõe um caminho mais realista. Algumas estratégias:
- Montar o prato com 80% de alimentos in natura, deixando apenas uma pequena parte para exceções.
- Evitar grandes quantidades de álcool em uma única ocasião e respeitar limites pessoais.
- Planejar momentos de exceção, escolhendo quando vale a pena comer algo fora da rotina.
- Manter a atividade física, mesmo que adaptada ao ritmo das festas.
- Não transformar um deslize em uma semana inteira de exageros.
“Não precisamos ser perfeitos. Precisamos ser conscientes. O objetivo é celebrar sem perder de vista o nosso bem mais importante: a saúde”, afirma Malard.


