O texto que você vai ler a seguir é um presente. E, como todo presente especial, merece ser entregue exatamente como foi recebido: com reverência e admiração.
Conheci Vanusa Coêlho pela força da sua escrita — e, logo depois, pela profundidade da sua escuta. Foi impossível não me emocionar com cada linha deste artigo que toca, com beleza e precisão, um tema urgente e, ao mesmo tempo, atemporal: a desconexão com a nossa essência feminina.
Vivemos pressionadas a sermos tudo — e tudo ao mesmo tempo. E é por isso que o texto de Vanusa chega como um abraço e, também, como um chamado. Um chamado à lembrança, ao resgate, à coragem de perguntar de novo: “O que eu realmente quero?”
Escolhi publicar esta escrita na íntegra, sem nenhuma edição ou intervenção, porque o tema é necessário, a abordagem é generosa e a pergunta que ecoa em cada linha nunca foi tão atual.
Vanusa nos conduz com sabedoria por um paradoxo vivido por muitas mulheres: entre conquistas históricas e pressões invisíveis, entre a liberdade que sonhamos e os papéis que ainda nos impõem. Ela não oferece respostas fáceis — oferece consciência. E isso, para mim, já é revolucionário.
Desejo que este texto encontre você como encontrou a mim: no momento exato em que mais precisava se lembrar de quem é.

Vanusa Coêlho (Foto: Arquivo pessoal)
Vanusa Coêlho é doutora em Psicologia da Educação, com MBA em Recursos Humanos e especialização em Liderança Estratégica pela Fondazione CUOA (Itália). Atua há mais de 20 anos com desenvolvimento humano, integrando saberes da psicologia, educação e gestão. Escritora e palestrante internacional, dedica-se hoje à mentoria de mulheres e à condução de vivências que promovem autoconhecimento, bem-estar e fortalecimento do feminino.
O que querem as mulheres?
E quem as deixou perguntar?
Por Vanusa Coêlho

Entre papéis impostos e conquistas históricas, há uma pergunta que segue urgente: o que eu realmente quero? (Foto: Envato)
Durante séculos, essa pergunta ecoou nos bastidores da história — muitas vezes silenciada, outras tantas distorcida. Mas talvez nunca tenha sido tão urgente como agora. Afinal, o que é que nós, mulheres, realmente queremos? Será que queremos o que de fato precisamos? Ou será que passamos a desejar o que nos ensinaram a querer?
Nos dias de hoje, falar sobre o papel da mulher na sociedade parece uma conversa ultrapassada. Mas, se pararmos para ouvir com atenção, perceberemos que esse papel ainda é cheio de expectativas, julgamentos e contradições. A mulher moderna é chamada a ser tudo: bem-sucedida, independente, elegante, sexy, resiliente, acolhedora, mãe presente, profissional exemplar. Uma equação exaustiva — e impossível. E é justamente por isso que precisamos nos perguntar: qual é a nossa verdade? O que é nosso e o que nos foi imposto?
Um conto antigo, uma pergunta eterna
Conta-se que, no século XII, o jovem cavaleiro Arthur foi capturado por caçar em terras proibidas. Em vez de matá-lo, o rei lhe propôs um desafio: descobrir, em um ano, o que realmente quer uma mulher.
Arthur procurou por todas as partes, mas ninguém parecia ter uma resposta definitiva. Até que ouviu falar de Ragnell, uma bruxa poderosa, detentora da resposta, mas que cobrava um preço alto por seus saberes: casar-se com Gawain, o mais leal amigo de Arthur.
Apesar de Ragnell ser descrita como horrenda, Gawain aceitou o casamento por amizade e por honra. E, ao final do prazo, Ragnell revelou a resposta que salvaria Arthur:
“O que a mulher realmente quer é ser senhora de sua própria vida.”
O rei aceitou a resposta e libertou Arthur. E no dia do casamento, algo surpreendente aconteceu: a bruxa horrenda transformou-se em uma linda mulher.
Ela então explicou a Gawain que vivia sob um antigo feitiço: seria bela apenas metade do tempo — ou durante o dia, aos olhos do mundo, ou à noite, aos olhos do marido. A decisão caberia a ele.
Mas, por ele ter lhe concedido o direito de escolher por si mesma, o encanto se quebrou. E ela pôde, enfim, ser inteira: bela o tempo todo.
Esse conto, ainda que datado de tempos medievais, fala diretamente às mulheres de hoje. Ser senhora da própria vida continua sendo um ato revolucionário.
A mulher entre dois mundos

Liberdade não é ausência de limites, é presença de consciência (Foto: Envato)
Com as guerras, os movimentos feministas e a entrada das mulheres no mercado de trabalho, muita coisa mudou. Conquistamos espaços importantes, direitos essenciais, visibilidade. Mas, na ânsia de provarmos nosso valor, acabamos acreditando que o feminino era um obstáculo — e não uma potência.
Passamos a agir como “homens de saia”, como se o sucesso só fosse possível se nos moldássemos aos valores do masculino: lógica, produtividade, razão, ação.
E deixamos de lado a sabedoria ancestral do feminino: intuição, afeto, escuta, presença, cuidado, gestação — de filhos, ideias, sonhos.
O resultado? Uma geração de mulheres sobrecarregadas, exaustas e, muitas vezes, desconectadas de si mesmas.
A equação que não fecha

O feminino, quando resgatado, revela potência, pausa e sabedoria (Foto: Envato)
Somos cobradas para sermos profissionais impecáveis, mas também mães como nossas avós, que não trabalhavam fora.
Somos julgadas por escolher cuidar dos filhos, e também por escolher não tê-los.
Sentimos culpa por descansar, por dizer “não”, por priorizar a nossa saúde emocional.
E, muitas vezes, nem ao menos temos o apoio de outras mulheres, porque a cultura da disputa, comparação e crítica ainda grita mais alto do que a empatia entre o feminino.
Além disso, quantas de nós ainda vivem relacionamentos onde as tarefas domésticas são vistas como “ajuda”?
Quantas ensinam seus filhos homens a lavar a louça ou passar roupa?
Quantas ainda repetem, sem perceber, o ciclo de desigualdade dentro da própria casa?
Nada mudará enquanto não houver uma transformação cultural — e essa transformação começa em nós.
O resgate do feminino
A mulher só será, de fato, livre, quando puder ser quem ela é — e não quem esperam que ela seja.
Isso significa recuperar o valor daquilo que é feminino por natureza, ainda que diferente do que o mundo tradicionalmente valoriza.
Significa reconhecer a força da vulnerabilidade, o poder da pausa, a beleza da escuta, a inteligência do cuidado, a grandeza da intuição.
E também significa ter a coragem de dizer:
“Eu quero ser senhora da minha própria vida.”
Esse é o desejo oculto por trás de tantos dilemas, tantas buscas e tantas dores.
É o desejo que pulsa dentro da pergunta que ecoa há séculos e que ainda não perdeu a força:
Você quer… ou você precisa?