Comportamento

Entre as sombras e sol: onde o Dia dos Mortos deveria ser o Dia da Vida

Por
Marta Castro Luzbel

11/6/2025

Article banner

Festa de Halloween: uma apropriação de uma antiga celebração pagã (Foto: AdobeStock)

X logo

Muito além das fantasias e das caveiras, o Halloween e finados refletem a sabedoria ancestral dos ciclos da terra, onde o fim e o recomeço se encontram

Você já parou para pensar o que realmente estamos celebrando no Dia das Bruxas ou no Dia dos Mortos? Essas datas, que hoje fazem parte dos calendários comercial e religioso, têm origens muito mais antigas e profundas do que possamos imaginar.

O que chamamos de Halloween é, na verdade, uma apropriação de uma antiga celebração pagã. Mas antes de falar disso, gostaria de lembrar que a palavra pagão vem do latim paganus, que originalmente significava habitante do campo. Ou seja, os pagãos, hoje um termo pejorativo usado pelos cristãos, eram simplesmente homens e mulheres ligados à terra, aos movimentos da natureza, seus ciclos e mistérios.

Post image

Crianças no Halloween: costume de outro hemisfério e de outra estação (Foto: AdobeStock)

Voltando às celebrações... No hemisfério norte, onde essas tradições nasceram, o final de outubro marcava o ponto entre o outono e o inverno. Era quando as folhas caíam, a natureza se recolhia, o frio se aproximava. Tudo parecia morrer para, mais adiante, renascer. Dizia-se que, nesse período, o véu entre o mundo dos vivos e o dos mortos ficava mais tênue. As pessoas acendiam fogueiras e velas para guiar as almas e proteger as casas. Era um tempo de recolhimento, introspecção e reverência.

O Deus Sol, símbolo do masculino, também se recolhia. A energia masculina adormecia e encontrava o feminino, representado pela terra fértil e silenciosa. Era o momento em que a vida se curvava diante do mistério da morte, não com medo, mas com respeito e sabedoria.

Ritmos da natureza

Tudo na natureza, inclusive a nossa alma, vive nesse movimento eterno de morrer e renascer e agora o tempo por aqui é de renascer. É que nós estamos no hemisfério sul e, aqui, nesse mesmo período, vivemos o contrário: estamos entre a primavera e o verão, quando tudo floresce, a natureza é exuberante e o sol desperta. É o tempo da vida, da paixão, da fertilidade. Deveríamos estar celebrando o amor e a fecundidade, um encontro vibrante entre o masculino e o feminino, a celebração do florescer da vida.

Post image

Inverno e primavera: contraste entre os dois hemisférios (Foto: AdobeStock)

Fico me perguntando: estamos festejando algo que nos pertence ou apenas repetindo costumes de outro hemisfério, de outra estação, de outros interesses? Buscamos entender o que está por trás dos símbolos, das datas, das tradições para entender o que elas representam e se fazem sentido para nós? E a pergunta mais importante: estamos alinhadas com os ritmos da natureza?

Acredito que, só quando estamos em harmonia com os ciclos verdadeiros, os de fora e os de dentro, é que encontramos equilíbrio. Se no Norte o sol adormece e a terra descansa, por aqui o sol desperta e a vida se expande. No dia de hoje, eu posso até me fantasiar para entrar na brincadeira. Nada contra. Mas não vou me recolher. Hoje eu celebro o que floresce em mim, nos outros e na própria vida.